"Eighty percent of success is showing up", 17 de Setembro de 2023

"Eighty percent of success is showing up"

Ir ver ou ir ouvir Woody Allen?

texto: Gonçalo Falcão

Para quem foi ver o Woody Allen ao Campo Pequeno, creio que o concerto terá sido proveitoso: Ele veio e esteve lá, visível. Para quem o foi ouvir, foi custoso.

O realizador teve problemas com a palheta do clarinete que soou sempre a requinta nas mãos de um aprendiz numa orquestra filarmónica. Com o timbre agudo que o caracteriza altamente exagerado, inicialmente pensei que procurava um efeito cómico, mas depois percebi que não, era o que ele conseguia fazer – e fez – toda a noite. É verdade que Woody tem um som de clarinete grasnado, mas naquela noite levou-o ao exagero. Parecia por vezes um trompete de plástico. Some-se o facto de estar sem fôlego e de parecer tocar em esforço, as notas vinham sem modelação, secas, telegráficas e desarticuladas. As melodias eram mal tocadas, como se fosse um iniciante que se esforça por cumprir a sequência das notas, sem conseguir dar-lhes expressividade. Deplorável. Citando-o: o concerto azedou “qual queijo Roquefort”.

O Campo Pequeno esteve meio cheio. Os lugares mais caros da primeira plateia quase todos vendidos; a 2ª plateia estava com muitas cadeiras ocupados e as bancadas e camarotes com muito pouca gente. Surpreendente para mim que achei que só a presença do realizador bastaria para chamar muito público.

O concerto anunciava Woody Allen e a New Orleans Jazz Band, mas na verdade o que subiu ao palco foi uma versão updated da que toca no Carlyle Hotel em Manhattan; isto porque Eddy Davis, o líder e mentor original do grupo, morreu de Covid durante o período pandémico e foi substituído por Josh Dunn, no banjo. O contrabaixo também não é o da sua banda nova-iorquina trocado por Brian Nelepka. O resto do grupo é o que alinha regularmente com Kevin Dorn na bateria (que substitui John Gill), Conal Fowkes no piano, Simon Wettenhall no trompete (que deixou uma boa impressão nos solos e conseguiu, sem fugir muito dos processos clássicos, criar soluções interessantes) e Jerry Zigmont no trombone. Tocaram WC Handy, Jelly Roll Morton, George Lewis (Ice Cream) quase só clássicos dos ano 20 do século passado.

 Woody Alen e a sua New Orleans Jazz Band no Campo Pequeno

Continuando a citá-lo (numa referência a Sartre): “O inferno é o gosto das outras pessoas”. Por isso fiquei até ao fim para ver o que iria acontecer. Não antecipava uma vaia – dado que o clarinetista é demasiadamente admirado (incluindo por mim), mas nada me preparou para uma ovação de pé, que o obrigou a ter que voltar a palco e tocar mais. Como é possível...? Será que a comunidade musical internacional já sabe que em Portugal o público é totalmente acrítico e que aplaude sempre de pé excitadíssimo? É que se havia concerto que claramente não merecia um bis era este.

Some-se o facto de que ouvir uma hora de Dixieland e Ragtime (com um blues e um gospel pelo meio) é um bocado monótono. Com copos, num bar, com comida – super. Numa plateia, a seco... é áspero.

Eu desisti. Já tinha pago pelos meus pecados (e fiquei com créditos para amigos e familiares).

Saí; no exterior do Campo Pequeno uma jornalista da SIC dirigiu-se-me e perguntou o que tinha achado do concerto. Não consegui dispor da insinceridade benigna destas circunstâncias. Respondi-lhe “péssimo”. Mas pedi-lhe para não gravar a minha opinião e esperar pelas outras pessoas que certamente lhe darão a palavra comum a toda a gente que sai de um espetáculo em Portugal: “espetacular”. Não deixa de ser verdade, “derivado à situação”.

Para mim, que fui lá para ver o Woody Allen, valeu a pena. Dispensava ter que o ouvir durante uma hora, para vos poder contar como foi.

 

Pé de página ominoso: antes do concerto, junto à porta principal, dois homens esticavam uma pequena faixa onde se lia “Woody Go Home, No Pedophiles In Lisbon”. É espantoso como apesar de haver tanta informação fidedigna, de fontes oficiais, que o iliba destas acusações de Mia Farrow - e apesar de nada ter ficado provado em tribunal (muito pelo contrário) e dos textos estarem consultáveis, há quem continue a vir a público sujar o nome dos outros, fazendo acusações tão graves, eternizando as práticas do Santo Ofício e dos tribunais populares.

Agenda

04 Outubro

Carlos Azevedo Quarteto

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04 Outubro

Luís Vicente, John Dikeman, William Parker e Hamid Drake

Centro Cultural de Belém - Lisboa

04 Outubro

Orquestra Angrajazz com Jeffery Davis

Centro Cultural e de Congressos - Angra do Heroísmo

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Centro Cultural e de Congressos - Angra do Heroísmo

05 Outubro

Peter Gabriel Duo

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05 Outubro

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05 Outubro

Themandus

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06 Outubro

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SMUP - Parede

06 Outubro

Marta Rodrigues Quinteto

Casa Cheia - Lisboa

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