Jazz na Caixa ’23, 18 de Abril de 2023

Jazz na Caixa ’23

Fora da caixa

texto: Nuno Catarino / fotografia: Whale’s Mouth

Nos dias 14, 15 e 16 de abril realizou-se mais uma edição do Jazz na Caixa, ciclo de concertos promovido pelo Eixo do Jazz que teve lugar no Teatro Narciso Ferreira, no concelho de Famalicão. A jazz.pt foi conhecer este festival.

A associação Eixo do Jazz – Associação Luso-Galaica para a Promoção do Jazz surgiu em 2017, sedeada em Vila Nova de Famalicão, e tem como principal rosto Cristina Marvão (presidente da direção). Desde a sua fundação, o Eixo do Jazz tem organizado regularmente concertos e residências artísticas, promovendo momentos de formação de jovens músicos com músicos já consagrados, entre o norte de Portugal e a Galiza. As iniciativas do Eixo já contaram com a participação de dezenas de jovens músicos e também com os mestres portugueses Mário Laginha e João Paulo Esteves da Silva e os galegos Iago Fernández e Abe Rádabe. Uma das iniciativas que têm sido promovidas ao longo destes anos pelo Eixo é o Jazz na Caixa, ciclo de concertos que este ano se realizou nos dias 14, 15 e 16 de abril, no Teatro Narciso Ferreira. Este é um belíssimo espaço cultural, que foi recentemente renovado, situado na freguesia vizinha de Riba de Ave e que, pela qualidade das instalações, merecia acolher uma programação atenta e regular.


Vozes do EJE


Nesta edição 2023, o ciclo Jazz na Caixa apresentou uma residência/workshop e quatro concertos e que tiveram como característica comum o facto de todos os projetos serem liderados por mulheres. Tivemos oportunidade de assistir aos concertos de dia 15, sábado, naquela que foi a estreia da jazz.pt nas iniciativas do Eixo. Neste dia tiveram lugar duas atuações, o grupo Vozes do EJE (18h00) e o projeto O Canto das Sereiras de Yudit Almeida (19h30). O grupo Vozes do EJE reúne cantoras que têm participado no Eixo do Jazz Ensemble, grupo musical promovido pela associação que tem colaborado com os referidos músicos. O ensemble editou no ano passado o seu registo de estreia, “Eixo do Jazz Ensemble meets Mário Laginha”, numa colaboração com o reconhecido pianista. Nesse disco participam as cantoras Teresinha Sarmento e Joana Raquel (que já bem conhecemos, dos discos “Ninhos” e “Membrana”, e que se apresentou à jazz.pt nesta entrevista); juntam-se aqui outras duas jovens cantoras, Ana Luísa Fonseca e Deva Sanmartin; e as vozes contam ainda com o apoio instrumental do contrabaixo de Yudit Almeida. Juntas em palco, as vozes de Joana, Teresinha, Ana Luísa e Dava interpretaram temas de compositores que já trabalharam com o Eixo (Laginha, Esteves da Silva, Fernández e Rábade), acrescentando ainda dois temas tradicionais e dois originais, da autoria de Joana Raquel e Teresinha Sarmento. A atuação abriu com “Arrollo de Alba”, tema de Iago Fernández, sem palavras, onde o quarteto vocal exibiu desde logo a originalidade da proposta de tratamento harmónico, combinando diferentes registos ao serviço do tema. Seguiram-se “Ó que estriga” (tradicional), “Madrigueiras” (de Joana Raquel), “Amor de Raíz” (de Abe Rábade), “Coro das Meninas” (de Mário Laginha), “Diálogo, voz, transformação” (de Teresinha Sarmento e letra de Cristina Marvão), “Tristo” (de João Paulo Esteves da Silva e letra de Nazaré da Silva, que também já a cantou) e “Na, na, na , na” (tradicional). As cantoras trataram de interpretar os temas com profissionalismo, bem interligadas, sem desatenções nem desafinações; o contrabaixo de Almeida acrescentava um tapete instrumental seguro, sobre o qual as vozes navegavam. A proposta foi globalmente interessante, embora se tenham repetido as mesmas estratégias. No final a performance foi sendo mais expansiva, resultando também mais interessante para o público (que nesta altura não tinha ocupado ainda todas as cadeiras da sala).


Yudit Almeida


Seguiu-se a atuação do projeto O Canto das Sereias de Yudit Almeida, projeto que já tínhamos conhecido aquando do 11.º Festival Porta-Jazz. Nesta altura, chegou mais público e a sala do Teatro Narciso Ferreira ficou bem preenchida. Yudit Almeida, que nasceu em Cuba e tem vivido entre a Galiza e o Porto, apresenta aqui uma posposta musical original, que inclui também uma vertente ativista; com textos introdutórios (originais) entre cada tema, a contrabaixista e cantora parte das lendas de sereias para refletir sobre a condição da mulher e a desigualdade de género. Juntaram-se as cantoras Teresinha Sarmento e Joana Raquel (repetentes do concerto anterior) e dois ótimos instrumentistas: a pianista Catarina Rodrigues e o baterista Gonçalo Ribeiro. Esta música vai beber a diferentes estilos e é trabalhada com originalidade. Além das seis composições de Yudit, o grupo interpretou ainda dois temas alheios: o bolero “Alma Mia” de Maria Grever e um tema de Esperanza Spalding (que, como Yudit, canta e toca contrabaixo), “I Adore You”. No texto da reportagem jazz.pt do concerto do Porta-Jazz 2021, sem referências prévias de nenhum dos músicos envolvidos, referimos “o sentido rítmico de Ribeiro e a versatilidade da voz de Joana Raquel”; na bateria, Gonçalo Ribeiro voltou a confirmar as suas qualidades, é cada vez mais um nome a ter em atenção, que vai já espalhando talento em diferentes projetos; Joana já não deverá ser surpresa para ninguém, depois do seu recheado ano de 2022; a pianista Catarina Rodrigues, apesar de não ter muito espaço para se exibir, mostrou bons apontamentos; e a cantora Teresinha Sarmento voltou a mostrar-se em bom plano. A cantora galega Deva Sanmartin participou ainda num tema, como convidada. Individualmente competentes, os músicos mostraram-se coletivamente bem conectados e a música fluiu com elegância. Foi uma atuação original, marcada pelo texto-manifesto pela igualdade, mas sobretudo pela originalidade da proposta musical da contrabaixista cubana.


Clara Lacerda (The Peace of Wild Things)


O Jazz na Caixa completou-se com o concerto de apresentação do workshop de voz, que se realizou na sexta-feira, dia 14 (o workshop foi promovido com um grupo de crianças/jovens adolescentes, entre os 10 e os 15 anos); e no domingo, dia 16, o público famalicense acolheu o trio The Peace of Wild Things, de Clara Lacerda, Romeu Tristão e Ricardo Coelho, no final da tarde de domingo (que já não tivemos oportunidade de assistir). No Eixo do Jazz trabalha-se com amor pela música e neste ciclo de concertos sentimos isso mesmo: ao chegarmos, fomos recebidos com atenção e simpatia, atenção que é colocada em cada um dos projetos que o Eixo do Jazz vai promovendo. Mesmo com uma equipa pequena e poucos recursos, o Eixo trabalha fora da caixa e surpreende pela sua dinâmica. 

Agenda

10 Junho

Imersão / Improvisação

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

O Vazio e o Octaedro

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

Marta Hugon & Luís Figueiredo / Joana Amendoeira “Fado & Jazz”

Fama d'Alfama - Lisboa

10 Junho

Maria do Mar, Hernâni Faustino e João Morales “Três Vontades de Viver”

Feira do Livro de Lisboa - Lisboa

10 Junho

George Esteves e Kirill Bubyakin

Cascais Jazz Club - Cascais

10 Junho

Nuno Campos 4tet

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

Tim Kliphuis Quartet

Salão Brazil - Coimbra

10 Junho

Big Band do Município da Nazaré e Cristina Maria “Há Fado no Jazz”

Cine-teatro da Nazaré - Nazaré

10 Junho

Jorge Helder Quarteto

Fábrica Braço de Prata - Lisboa

11 Junho

Débora King “Forget about Mars” / Mayan

Jardins da Quinta Real de Caxias - Oeiras

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