The Comet Is Coming
Um trio de… jazz?
Os The Comet Is Coming passaram por Lisboa e fizeram suar as estopinhas a quem assistiu. Numa demonstração de força e vitalidade, este trio composto pelo saxofone tenor de Shabaka Hutchings, os sintetizadores e modulares de Dan Leavers aka Danalogue e a bateria de Max Hallet aka Betamax veio promover o seu último álbum de 2022, "Hyper Dimensional Expansion Beam". O disco mais produzido da banda gerou curiosidade e a sala um do Lisboa Ao Vivo apresentava-se bem composta, muita gente nova, de diversos géneros e tendências, tal como o som deles.
Shabaka Hutchings é a figura de proa da nova cena de jazz inglesa. Profícuo, desmultiplica-se em projectos variados como os Sons of Kemet ou em nome próprio com os Ancestors, sendo os Comet o seu projeto menos jazzy. A última música antes do concerto começar foi uma dubstepada dum qualquer Skrillex da vida, estava dado o mote: Quem não gosta de coisas frescas, pode sair!
O concerto começa com temas do último álbum, “Code” arranca as primeiras reações efusivas do público, com aquela métrica tão característica de Shabaka, depois “Summon the fire”, o tema do seu disco “Trust in the lifeforce of deep mystery” que rebentou com 60.000 pessoas em Glastonbury em 2019, encarregou-se de perpetuar a festa.
A música foi correndo com mais ou menos energia mas sem nunca esmorecer.
Ao fim duma hora a coisa ficou mais cerebral, surpreende-me a liderança de Dalanogue que entre arpejos no seu Roland e muitos efeitos modulares, conduz o trio numa celebração que felizmente, remete mais para os Chemical Brothers que para um qualquer funk dos anos 70, trazendo o som para a contemporaneidade necessária e ferindo de morte os fãs dos teclados de Rick Wakeman.
Aqui há que ressalvar a força deste trio, aquilo não é um pianinho a falar com uma bateria swingada e um saxofone por-do-sol. Pelo contrário, aquilo é um sintetizador a arranhar que luta com um saxofone que berra. É coisa para quem gosta de power, muito free, algo techno, fora da caixa de rótulos certinhos.
Shabaka tem um pulmão que faz gritar o seu tenor como se fosse um parto, Danalogue não para quieto a rodar botões, como se para acrescentar camadas ao som denso dos seus Rolands.
A malta dança, diverte-se, bate palmas, grita… definitivamente longe do jazz dos Sons of Kemet ou dos Shabaka and the Ancestors, este som grita século XXI.
É feito por músicos que depois do conservatório se enterravam em caves escuras a dançar os ritmos eletrónicos da Londres do início do século e isso, por muito que custe à malta do jazz mais clássico, faz toda a diferença. Estarei a ser injusto? Talvez mas…
O que tem isto tudo a ver com o concerto? Foi uma celebração que não se cingiu ao jazz, remetendo para uma abertura de espírito que se exige a quem usa pomposamente rótulos de “free” e “avant garde”.
Ao fim de quase duas horas e um encore apoteótico, a sala estava exausta e feliz e isso, é dos melhores elogios que se podem fazer a uma actuação ao vivo.
Os Comet Is Coming actuam no Porto, no Primavera Sound a 7 de Junho, no mesmo dia do gigante Kendrick Lamar, get it?!