Neighbour Lizard
Reis lagartos
O Auditório do Liceu Camões, em Lisboa, acolheu a estreia mundial de um novo quarteto “all-star”: Nelson Cascais, João Mortágua, André Fernandes e João Lencastre apresentaram a música do disco “Neighbour Lizard”. Aconteceu no dia 8 de junho e a jazz.pt teve o privilégio de acompanhar os primeiros passos desta nova formação.
Em 2020 os Prémios Play – Prémios da Música Portuguesa atribuíram pela primeira vez uma distinção à categoria de “melhor álbum jazz”: o vencedor foi João Mortágua (com “Dentro da Janela”); em 2021 o vencedor foi André Fernandes (com “Dianho”, do seu projeto Centauri); e em 2022 venceu João Lencastre (com o disco “Unlimited Dreams). Agora, por coincidência, o contrabaixista Nelson Cascais reuniu estes três músicos premiados num projeto único. Estes músicos têm desenvolvido diversas colaborações entre si: Cascais e Lencastre são 2/3 do No Project; Mortágua toca no grupo Centauri de Fernandes; no projeto MENtOR, de Cascais, tocam Mortágua e Fernandes; e Cascais e Fernandes participam no grupo Communion de Lencastre; e estes são apenas alguns exemplos, as ligações não se ficam por aqui.
O novo quarteto trabalhou em conjunto numa residência artística promovida pelo projecto Jazz Composers Workshop, uma iniciativa apoiada pelo programa Garantir Cultura 2021: ao longo de uma semana, Cascais, Fernandes, Mortágua e Lencastre compuseram, criaram e gravaram música nova (e alguns desses ensaios foram mesmo abertos ao público). No final, o grupo gravou um total de oito novos temas, reunidos no álbum “Neighbour Lizard” que será brevemente publicado pela editora Robalo. O quarteto apresentou-se ao vivo, pela primeira vez, no Auditório do Liceu Camões, em Lisboa, um concerto transmitido pela Antena 2.
O concerto arrancou a horas. Entrámos atrasados quinze minutos e perdemos as primeiras duas músicas (não deu tempo de ouvir “Turritopsis Nutricula” de Cascais e “Poro” de Mortágua). Quando chegámos, já a banda ia no terceiro tema, “Humano Sintético”, composição de André Fernandes, apanhada a meio. Todos sabemos bem que os quatro – Nélson Cascais (contrabaixo), João Mortágua (saxofone alto), André Fernandes (guitarra) e João Lencastre (bateria) – são músicos superlativos, de qualidade extraordinária e capacidade para se adaptarem aos mais diversos ambientes musicais. Juntos em palco, a música flui com naturalidade, não precisam de fazer esforço para a máquina funcionar. No palco do Liceu Camões, 50% da banda (Cascais e Fernandes) usava óculos de sol, mas a coolness da sua música já é evidente, dispensa acessórios.
No tema que dá nome ao disco, “Neighbour Lizard” (da autoria de João Lencastre), destaca-se o acrescento da eletrónica manipulada por Fernandes, que surpreende a ir além da habitual guitarra (e efeitos). O tema “Vampyroteuthis Infernalis” (original de Nelson Cascais), destacou-se desde logo pelo balanço groove, crescendo ainda mais com o sax esfuziante de Mortágua – foi o tema que mais se destacou da setlist, daqueles que presenciámos. E, para fechar, o grupo atacou mais uma composição de Lencastre: “Zoladkowa” (título inspirado numa vodka polaca). Este tema, de raíz contemplativa, abre com uma longa exploração de guitarra e bateria em duo; entram depois o contrabaixo e o saxofone, e Mortágua vai-se esgueirando, escorregadio como uma enguia. Há umas semanas vimos Mortágua a brilhar com o free intenso de Alma Tree; voltamos a encontrá-lo no disco "Pilgrimage"; e agora, num contexto completamente diferente, o saxofonista continuar a brilhar; em qualquer ambiente está como peixe na água.
Foi um enorme privilégio termos tido a oportunidade de assistir aos primeiros passos deste novo projeto. O álbum do quarteto, “Neighbour Lizard”, será brevemente publicado pela Robalo. A expectativa está altíssima.