Sei Miguel / César Burago
Tensão anunciada
Fomos à ZDB ver o “Show 53”. Sei Miguel e César Burago, trompete e percussão, som e silêncio.
Tal como as partituras gráficas das quais resultam os temas de Sei Miguel, a sua música não deve ser interpretada linearmente. Falar da sua técnica ou das composições (num sentido estrito) é descurar toda uma sensibilidade que tem influenciado directa ou indirectamente muitos dos músicos mais interessantes da cena musical portuguesa.
O trabalho insistente com membros regulares e exclusivos (do seu “Unit Core” apenas Pedro Gomes trabalha também com outros músicos) aprofunda a linguagem do conjunto e multiplica a persona musical de Sei Miguel por todos os seus companheiros, funcionando estes como extensões e parte integrante da mesma. Em duo, Sei Miguel (trompete de bolso) e César Burago (percussão) apresentaram “Show 53” no passado dia 8 de Fevereiro num concerto intimista no “aquário” da galeria Zé dos Bois.
O concerto foi dividido em temas mais ou menos curtos, funcionando numa lógica de tensão anunciada. A fronteira entre som e silêncio esteve muitas vezes despida ao longo da noite, com as percussões inquietantes de César Burago a perturbar os intervalos sonoros do trompetista. Este soprou sobre a sua própria história do jazz.
Sei Miguel aproveitou a ocasião para partilhar temas já tocados anteriormente, mas também inéditos. Reinterpretou peças de Dave Burrell e terminou a noite com uma belíssima homenagem a John Coltrane.
A oferenda foi aceite e os deuses do jazz estão contentes.