Nuno Tavares Quarteto: “Escadas” (Edição de autor)
Edição de autor
Pianista, compositor, arranjador e produtor, Nuno Tavares acaba de lançar o seu registo de estreia, “Escadas”. Com ele estão o saxofonista Desidério Lázaro, o baixista Yuri Daniel e o baterista Alexandre Alves.
Por só agora lançar o seu álbum de estreia em nome próprio, não se pense que Nuno Tavares é um novato nestas andanças. Pianista, compositor, arranjador e produtor com atividade em várias frentes, tanto a nível nacional quanto internacional, é licenciado em Composição pela Escola Superior de Música de Lisboa, tendo prosseguido paralelamente estudos na área do Jazz. Frequentou os prestigiados Taller de Musics, em Barcelona, e Berklee College of Music, em Boston, bebendo ainda das abordagens de Mário Laginha e Bernardo Sassetti. Colaborou com músicos como José Mário Branco, Carlos Barretto, Luís Candeias, Nanã Sousa Dias, Joel Silva, João Barradas, Hugo “Vicky” Marques, para apenas mencionar alguns. Trabalha em parceria com a Orquestra Geração, sendo autor de arranjos interpretados por Salvador Sobral, Maria João, Nancy Vieira e Mário Laginha. Entre as obras que compôs, destaca-se a peça para orquestra “Sorrow of Those Who Stayed”, apresentada pela Orquestra Sinfónica da Escola Superior de Música de Lisboa, sob a direção do maestro Vasco Pearce de Azevedo.
Neste seu registo inaugural, “Escadas”, encontramo-lo em formato de quarteto, acompanhado por três músicos consagrados e de personalidades vincadas: o saxofonista Desidério Lázaro, o baixista Yuri Daniel e o baterista Alexandre Alves. «Este disco é o culminar de experiências acumuladas na área da composição, improvisação, orquestração, produção de arranjos e direção musical», começa por dizer Nuno Tavares à jazz.pt. «Surgiu da vontade em apresentar material original que capturasse as minhas influências musicais e que, ao mesmo tempo, pudesse encontrar uma voz própria», acrescenta o pianista. O título do álbum alude precisamente a esse primeiro passo, para «o início de um caminho a percorrer como intérprete de música original, o primeiro disco.» Esta coleção de peças inclui algumas compostas há já algum tempo e outras mais recentemente: «O processo de produção iniciou-se com concertos ao vivo, de forma a compreender caminhos possíveis, aperfeiçoar a interatividade entre os músicos e concluir estruturas, antes da gravação.»
O quarteto constituiu-se cerca de um ano antes da gravação do disco, embora anteriormente já houvesse uma convivência musical consistente, através da colaboração em diversos projetos. «Ter oportunidade de trabalhar com músicos com experiência musical tão intensa como o Yuri Daniel e o Desidério Lázaro, quer no plano da composição como na improvisação, tem sido prazeroso e muito enriquecedor para o quarteto», sublinha Nuno Tavares. «A cumplicidade musical que tenho com o baterista Alexandre Alves permitiu a colagem minuciosa entre os aspetos rítmico e melódico dos arranjos, além de que a sua participação em inúmeros projetos de música improvisada facilita a interatividade do grupo.» A música que escutamos é sóbria e elegante, com a vertente lírica a ser especialmente explorada. «A componente melódica dos temas é bastante específica, assertiva e, de certo modo, fechada», explica. «Mas houve uma grande contribuição dos restantes músicos no que diz respeito à textura de acompanhamento, além de que a secções de improvisação são fruto da colaboração e interação entre nós.»
As sete peças incluídas em “Escadas” resultam de um longo e aturado processo de cruzamento de influências várias, que vão do jazz à música erudita, passando por sonoridades de várias partes do globo, em especial de África, e pela cultura urbana. Do seu rol referencial, constam Brad Mehldau, Aaron Parks, Robert Glasper, Chano Dominguez, Oumou Sangaré, Johann Sebastian Bach e Claude Debussy. «A improvisação e o diálogo musical entre os intervenientes são os fatores que unem o álbum, apesar das diversas texturas e dinâmicas. É um disco que retrata viagens e reflexões», sublinha o pianista. “Mediterrâneo”, a peça de abertura e a mais extensa, é declaração de intenções, nas suas dinâmicas judiciosamente arquitetadas e feitas de cruzamentos de elementos contrastantes, motivos arabizantes e um ritmo buliçoso que o piano suporta, com o contrabaixo e a bateria a aditarem delicadeza; o saxofone tenor de Desidério Lázaro traz uma fluidez poderosa que tudo ilumina. A peça que dá título ao álbum explora o contraponto de forma interessante, no contexto de quarteto: o piano cristalino de Tavares em associação próxima ao saxofone (aqui soprano) de Desidério Lázaro, num jogo de aproximações e distanciamentos, com a secção rítmica a fornecer base sólida.
Mais agitada, “3 Suspensos” assenta na repetição de três acordes (daí o título), que contrastam com o sóbrio, mas sempre interventivo, baixo de Daniel e o saxofone ágil de Lázaro. “Mais Espaço” é uma das peças mais interessantes do disco, com a sua atmosfera suavemente dinâmica, desaguando em episódios mais poderosos, avultando o solo de bateria. “Perseverança” mostra como Tavares tem ensejo de explanar o lado mais lírico do seu pianismo, ainda que com alguma tensão de permeio; Lázaro assina outra bela intervenção. De “Madrugada”, peça elegante de toada lenta, fixa memórias a bela linha melódica desenhada pelo soprano de Lázaro sobre um tapete groovy que os outros três urdem, em especial a pulsação proposta pela bateria. A fechar, “Madrid” é uma peça de arquitetura sóbria inspirada numa viagem que Tavares fez à capital espanhola, trazendo-a para o tema-base, lançado por um ostinato inicial, com a peça a evoluir gradualmente para uma harmonia mais luminosa.
Álbum elegante, “Escadas” deixa pistas interessantes e eleva a expetativa para o que Nuno Tavares fará daqui para a frente.
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Escadas (Edição de autor)
Nuno Tavares Quarteto
Nuno Tavares (piano, composições); Desidério Lázaro (saxofones); Yuri Daniel (baixo elétrico); Alexandre Alves (bateria)