Gonçalo Mortágua / Ernesto Rodrigues / Guilherme Rodrigues / Gunter “Baby” Sommer: “Not Bad” (Creative Sources)

Creative Sources

Sofia Rajado

Nesta edição Creative Sources estão reunidos Gonçalo Mortágua, Ernesto Rodrigues, Guilherme Rodrigues e Gunter “Baby” Sommer. Uma boa surpresa: música sem barreiras, sem preconceitos.

“Not Bad” é o primeiro trabalho do quarteto que junta Gonçalo Mortágua no saxofone tenor e flauta de bambu, Ernesto Rodrigues na viola d’arco, Guilherme Rodrigues no violoncelo, Gunter “Baby” Sommer na percussão, e espelha a ideia abstrata de sobreposição dinâmica de camadas sonoras esguias, que por vezes se misturam e adquirem um caráter próprio, à medida que a música avança. É uma formação menos usual, já que não há a figura do contrabaixo nos graves e sim do violoncelo, o que torna o disco algo particular. Foi gravado em 2022, no Studio Zentri Fuge, em Berlim. As composições foram construídas em coletivo. 

É notória a presença de diferentes influências musicais. Claro que isso acontecerá sempre, nenhum artista está dissociado da sua trajetória de vida, mas o que ressalta em “Not Bad” é a capacidade dos quatro músicos para coser os diferentes retalhos que constroem uma manta diversa. Com muita fluidez, ao longo das 11 faixas do disco caminha-se por um espetro sonoro alargado. Face aos músicos envolvidos, e como seria expectável, há influências de jazz e free jazz, música improvisada, mas também de música “tradicional”, a trazer-nos sons e frases que lembram a natureza, ou remontam para ambientes instrumentais do cancioneiro popular português.

O álbum inicia-se com “Abertura”, onde o som da percussão chega como se vindo de um mundo subterrâneo e intimista, ao qual se junta o arco da viola e, posteriormente, o violoncelo e o saxofone. É um acordar que se faz devagar, atento aos pormenores. Em “Invocação” é trazida a combinação de sons perdidos algures no tempo como, por exemplo, a mistura de melodias do berimbau de boca com a flauta de bambu, algo pouco escutado por estes dias e que remonta, como já referido, à musicalidade de um passado de música tradicional, concertada com a intervenção da viola d’arco, de carácter persistente e cíclico, causando ambiente de tensão.

Em todo o disco a percussão tem um papel muito determinante, mas ao escutarmos “Instant Impressions”, seguida de “Untitled”, Gunter “Baby” Summer revela-nos de forma clara toda a sua bagagem musical, a sua assertividade e dialética rítmica destacam-se. O que vem novamente a confirmar-se em “Letzter Wurf”. Mas, ainda em “Untitled”, é salientada a combinação perfeita deste quarteto, com criações musicais de cada um a encontrar-se com o todo, reforçando novamente a ideia de camadas, permitindo que cada músico se expresse individual e coletivamente. Esta faixa é uma das mais fortes do disco, a terminar num ambiente musical um pouco punk/rock, a surgir em jeito de surpresa.  O violoncelo demonstra toda a sua energia e versatilidade em “Duo”, onde se expressa em conjunto com a percussão. O caminho pelo instrumento é de tal forma amplo, que por vezes nos questionamos se se trata de facto do violoncelo ou da viola, dado alguns elementos agudos usados em pizzicato.

O saxofone destaca-se, mas de forma equilibrada. Se em “Verve” toma um tom mais orgânico, até mais afirmativo e de acordo com o solicitado, por outro em “Unduo”, junto com a viola, demonstra a sua delicadeza a ajuste sonoros, acompanhando de forma minuciosa e dialogante, a linguagem rápida e precisa da viola, com uma personalidade muito própria, já conhecida de Ernesto Rodrigues. 

“Not Bad” é uma agradável surpresa e foge de um certo padrão a que por vezes nos habituamos a ouvir. É um disco sem barreiras, sem preconceitos, onde os músicos se entregam ao desconforto, sem medo – uma miscelânea que combina na perfeição. A sua originalidade e diversidade, é a sua riqueza.

 

 

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  Not Bad (Creative Sources)

  Gonçalo Mortágua / Ernesto Rodrigues / Guilherme Rodrigues / Gunter “Baby” Sommer

  Gonçalo Mortágua (saxofone tenor e flauta de bambu); Ernesto Rodrigues (viola d’arco); Guilherme Rodrigues (violoncelo); Günter "Baby" Sommer (percussão)