Angélica Salvi: “Habitat” (Lovers & Lollypops)

Angélica Salvi: “Habitat” (Lovers & Lollypops)

Lovers & Lollypops

Gonçalo Falcão

“Habitat” é um muito apetecido disco de Angélica Salvi. A harpista que nos adotou como casa em 2011 tem desenvolvido um trabalho musical notável em várias frentes  composição, improvisação e pedagogia (leciona no Conservatório de Música do Porto). A harpa não é um instrumento fácil – não só pela sua (aparente) pouca flexibilidade, mas também pela sua dimensão histórica e timbre muito particular que nos remete automaticamente para um certo tipo de ambiente. Pois Angélica Salvi contraria todas as ideias-feitas e dá-nos um disco lindíssimo.

Tal como em “Phantone”, que saiu em 2019, “Habitat” foi lançado pela Lovers & Lollipops, uma editora associada ao rock e à música experimental com um ouvido atento e sabedor. Tal como o seu predecessor, “Habitat” só saiu em vinil (formato físico, vinil branco) e nas plataformas de streaming.

Esta música é transparente. O som da harpa é traficado por vários tipos de sevícias, das físicas às eletrónicas, dando-lhe outras dimensões. Todas as composições assentam em melodias lindíssimas que evoluem lentamente, como nuvens isoladas em dias de céu limpo. Salvi usa as cordas graves como bordões que vão marcando o baixo das músicas e nos dão uma ideia de estrutura. Á frende vai o dedilhado rápido, harpejos-harpeados, das canções em que a repetição cria um padrão que vai evoluindo lentamente, como os minimalistas americanos nos ensinaram.

Respeita-se a natureza e a história do instrumento que vem da Grécia antiga mas que soa agora diferente, atual, cheio de ar e leveza. Como se aquele maquinismo de madeira pesada flutuasse. Esta forma de o usar é interiormente histórica e ao mesmo tempo profundamente contemporânea. Todos os sons partem da harpa: preparada (em “Lolong”as cordas tem Blu-Tack, por exemplo, em “Ismos” usa tubos, blender, arco de violino e loops) e processada, com eletrónica desenhada por João Carvalho (que assina a produção), num discurso que introduz duas personalidades diferentes a viver no mesmo edifício sonoro.

As composições são todas de Angélica Salvi, exceto “Arpa”, escrita pelo T-Klass com eletrónica do Alexandre Soares (mas que lhe foi dedicada, foi escrita para Angélica). “Habitat” (como o próprio nome indica) foi gravado em casa, no estúdio da harpista, por James Hurts e masterizado pelo Carlos Fuchs.

Angélica Salvi é uma música admirável, capaz de se adaptar a realidades tão distintas como tocar com Evan Parker e Butch Morris ou com a Orquestra Sinfónica da Casa da Música. Uma mulher extraordinária que está a construir um caminho muito individualizado na música. Por sorte nossa, a partir de Portugal.

A sua música é como acordar feliz.

 

 

  • Habitat

    Habitat (Lovers & Lollypops)

    Angélica Salvi

    Angélica Salvi (harpa, harpa preparada, eletrónica)

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