Lopez Trio: “Matanzas” (Relative Pitch)
Relative Pitch
O contrabaixista, compositor e improvisador Brandon Lopez acaba de editar “Matanzas”, novo disco em trio na companhia do saxofonista Steve Baczkowski e do reputadíssimo baterista Gerald Cleaver. Tem selo da Relative Pitch e a jazz.pt já o escutou.
A música de Brandon Lopez (n. 1988) tem sido apodada amiúde de “brutal” ou “implacável”. Não sendo uma adjetivação destituída de parte da verdade, o certo é que não devemos deixar-nos cercear por ela, inibindo-nos de a julgar devidamente em toda a sua significativa amplitude.
Contrabaixista, compositor e improvisador residente em Nova Iorque, trabalhando à margem do jazz, improvisação livre, noise e da new music, Lopez tem vindo a erigir um sólido corpo de trabalho. Da Sala David Geffen da Filarmónica de Nova Iorque às caves DIY de Brooklyn, Lopez tem trabalhado ao lado de muitas luminárias do jazz e da música erudita, mas também da poesia e da música mais experimental, incluindo Fred Moten, John Zorn, Okkyung Lee, Ingrid Laubrock, Tony Malaby, Tyshawn Sorey, Chris Potter, Tom Rainey, Sun Ra Arkestra, Susan Alcorn, Mette Rasmussen, de entre muitos outros.
Como Artista Residente no Roulette em 2019–2020, Lopez apresentou-se com o seu trio composto pelo reputadíssimo baterista Gerald Cleaver (colaborador regular noutros projetos) e pelo saxofonista Steve Baczkowski (a génese do novo álbum), formação expandida para quarteto com a manipuladora de eletrónicas Cecilia Lopez, bem como uma performance a solo e um dueto com o trompetista Greg Kelley. Este trabalho deu continuidade ao que fizera anteriormente como Artista Residente na Issue Project Room e Van Lier Fellow, em 2018, na Roulette Intermedium. Da sua atividade nos anos mais recentes, avulta ainda a abertura da temporada de 2018-2019 da Filarmónica de Nova Iorque como solista na obra “Filament”, de Ashley Fure, e numa série de trabalhos com John Zorn, incluindo o 35.º aniversário de “Cobra”.
“Matanzas” – quem sabe se uma referência à segunda maior província de Cuba, onde se localiza uma das mais conhecidas áreas turísticas do planeta –, com selo da nova-iorquina Relative Pitch, é o seu mais recente álbum em trio, na companhia dos já mencionados Baczkowski e Cleaver. Duas peças longas e totalmente improvisadas a perfazerem uma duração total de perto de três quartos de hora. Este ataque sónico começa em “Dithyramb, Sodomy, Salt”, que logo aos primeiros segundos espoleta os sentidos, com o contrabaixo possante, o saxofone áspero, bateria (quase) sempre a ferver em lume alto. A dado momento tudo se aquieta: Lopez pega no arco, Baczkowski serpenteia, deixando espreitar laivos melódicos, e Cleaver propõe detalhes. O que escutamos é uma espécie de música de câmara para tempos plúmbeos.
“Gomorrah, Philadelphia” começa num registo mais fragmentado, com o saxofone a puxar pelos vuímetros, até Lopez e Cleaver entabularem um diálogo no limiar do silêncio, com o saxofonista a imiscuir-se, agora num registo mais desanuviado. Os três músicos entregam-se a explorações sónicas de ação e reação, com Cleaver a aportar até algum groove, que o saxofone contrasta com as suas ruminações e Lopez a funcionar como fiel deste equilíbrio instável. Uma secção near silence permite desvendar uma relojoaria interativa mais fina (Lopez proporciona espessa camada de base, sobre a qual os outros dois laboram). A dado instante, o saxofonista parte numa viagem free de destino ignoto, arrastando contrabaixo e bateria num crescendo de intensidade rumo ao final da peça.
“Matanzas” é um álbum que reclama atenção e com muito por descobrir.
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Matanzas (Relative Pitch)
Lopez Trio
Brandon Lopez (contrabaixo); Steve Baczkowski (saxofones); Gerald Cleaver (percussão)