Dry Thrust: “The Less You Sleep” (Trost)
Trost
“The Less You Sleep”, com selo da editora austríaca Trost, é o álbum de estreia do trio Dry Thrust. Um cocktail energético de jazz experimental, rock, noise e psicadelismo que a jazz.pt já escutou.
Uma sempre útil consulta ao dicionário ajuda a elucidar: dry thrust, em português impulso seco, significa geralmente o impulso não aumentado, isto é, o impulso de uma aeronave sem a utilização de pós-combustores (os chamados afterburners) ou a injeção de líquido. O impulso de um motor a jato pode ser aumentado usando métodos como injeção de água; nestes casos, o impulso (mais elevado) produzido é chamado de impulso molhado (wet thrust).
Mas outras mecânicas nos movem. Dry Thrust é também um trio transgeracional formado pelo pianista, organista e compositor alemão Georg Graewe, o guitarrista e manipulador de eletrónicas Martin Siewert (Radian, Trapist, Also) e o baterista Dieter Kern (DEK Trio, Bulbul, Fuckhead). “The Less You Sleep”, com chancela da austríaca Trost, é o aguardado álbum de estreia da formação e nele temos uma rara oportunidade de escutar Graewe a tocar órgão em vez de piano.
Georg Graewe tem vindo a liderar uma variedade de ensembles – de trios a orquestra de câmara – nos quais militam alguns importantes instrumentistas de música contemporânea. As suas composições incluem obras para orquestra completa, mas também bandas sonoras para cinema, produções teatrais e programas de rádio. Neste projeto há sinais (ainda que longínquos...) de jazz – dos trios “clássicos” de Jimmy Smith, Larry Young ou Lonnie Smith pouco escutamos –, mas sobretudo de rock desfiliado, livres experimentações eletrónicas, noise, um psicadelismo que remete para finais de sessentas e traços do krautrock mais aventuroso do decénio seguinte.
Três músicos experimentados interagem mais numa lógica do que será possível desbravar neste formato do que propriamente numa explanação das suas comprovadas capacidades. É sobretudo o organista quem aporta elementos jazzísticos, temperando a bateria vulcânica de Kern e a abrasividade de Siewert. A função abre com “Unruh”, tricot apertado entre guitarras, eletrónicas, órgão e bateria; “Backlit” traz abstrações carregadas eletricamente, nuvens de estática que se adensam e dissipam, espasmos, convulsões rítmicas. “In the Waiting” é feita de ruminações elétricas de proveniência ignota, a partir de ideias propostas pela guitarra. Se a primeira parte de “Vagaries ” é soturna, a segunda é mais psicadélica e agitada, com guitarra em frémito, recuperando memórias de um rock ido.
“Afterburner”, um dos melhores momentos do álbum, começa planante e imagético até ser interpelado por uma pulsação que lhe adita nova, e decisiva, dimensão, combinando sons orgânicos com as eletrónicas. Graewe propõe inquietantes drones de órgão e Kern uma quase marcha, enquanto Siewert intervém, mais distante. “Tanzschritte” retoma essa espécie de ritmo primordial, caldo cósmico do qual brotam formas mais definidas. “Wet Engine”, com guitarras em distorção, órgão fumegante, ritmo implacável, é o clímax da tensão que se acumulara até então.
“En Clair” é conversa a três, com as eletrónicas contrastadas pelas notas claras do órgão e percussão detalhada. A cortina desce com o irrequieto “Casimir Dynamics”, tour-de-force para o organista, excelente a construir pontes para logo as destruir.
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The Less You Sleep (Trost)
Dry Thrust
Georg Graewe (órgão); Martin Siewert (guitarras, eletrónicas); Dieter Kern (bateria)