No Nation Trio: “Habitation” (Phonogram Unit) 2
Diz-se este trio sem nação, em Inglês, apesar de os seus três elementos, Jorge Nuno, Hernâni Faustino e João Valinho, serem portugueses. Depois vem o título, “Habitation”. Está criado um binómio, o de uma desterritorialização combinada com uma ideia de território, de habitação. A foto na capa, com uma árvore, reforça a ambiguidade. Esta é uma música universal que é também de cá, daqui, do chão que há em todos os chãos do mundo. Música global que é música local, global porque feita de localidades indiferenciadas. Há árvores nela, muitas árvores. A música improvisada é uma música de árvores transcontinentais, sem pátria ou mátria, um Esperanto sonoro, mesmo que esse Esperanto venha em língua inglesa, a língua oficial da comunicação planetária. É um bom princípio, e convém relembrá-lo.
Este disco tem desde logo um “surplus”: dá-nos a oportunidade de ouvir Jorge Nuno com uma guitarra acústica, ele que, nos terrenos do rock psicadélico como nos da livre-improvisação, se tem feito notar com a eléctrica, sempre munida de um uso intensivo de pedais de efeitos. É outro, muito outro, o plano de intervenção que aqui cobre, revelando-nos ideias que não lhe conhecíamos. A combinação com a bateria de Valinho poderia resultar num mínimo denominador comum estabelecido entre ambos, pelo facto de este também vir do rock, e designadamente do black metal: seria uma fixação territorial, mas ainda que tal possa uma vez ou outra ocorrer algo vagamente, também o baterista desnacionaliza. Faustino cola as partes com o seu contrabaixo pelo lado menos óbvio – não aproveita as coincidências, constrói outras quando são maiores as improbabilidades. A consequência é uma música livremente improvisada que contorna as cartilhas desta prática musical. Soa a outra coisa, a uma folk sem bandeira. Ambígua decerto, mas autêntica. Trata-se de uma autenticidade rizomática, a do entrosamento das raízes florestais até se formar um organismo único debaixo da terra que pisamos, numa desterritorialização por via trans-territorial que tudo torna habitável.