Conjure

Karl Berger / Jason Kao Hwang: “Conjure” (True Sound)

True Sounds

António Branco

Reputados artífices da composição em tempo real, Karl Berger e Jason Kao Hwang – músicos de gerações diferentes, com quase 20 anos a separá-los – dão sequência em “Conjure” a uma parceria que remonta pelo menos aos tempos em que o violinista e violetista de ascendência chinesa integrou a orquestra do Creative Music Studio, estrutura fundada em 1971 por Berger, sua mulher, a cantora Ingrid Sertso, e Ornette Coleman.

Berger, nascido na Alemanha, octogenário, pianista e vibrafonista, também professor de composição, colaborou intensamente com luminárias como o já citado Coleman, Don Cherry, Gato Barbieri, Anthony Braxton, entre muitos outros, sendo um dos decanos da improvisação livre. Hwang, filho de pais chineses emigrados para os Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial, tem desenvolvido uma abordagem pouco convencional aos instrumentos que toca e à improvisação, desdobrando a sua atividade por um vasto conjunto de projetos e colaborações.

No ano passado, Berger (com Hwang na formação, a par de outros músicos relevantes da cena nova-iorquina, como Ken Filiano e Tomas Ulrich) editou “In a Moment”, parte final de uma trilogia para a Tzadik – selo de John Zorn –, uma suíte de 14 partes para piano e cordas. Também o violinista nos ofereceu em 2018 o excelente “Blood”, registo conceptual em octeto, no qual explorou a temática da violência inerente ao processo dor-regeneração, fixando o “sangue” como o agente primordial de cura.

Num domingo soalheiro de março de 2014, Hwang rumou ao norte do estado de Nova Iorque, em direção à histórica Woodstock, tendo como destino o estúdio Sertso para uma aventura musical, esta sem itinerário pré-determinado ou equipamento de orientação. Os dois músicos conhecem-se particularmente bem e deixaram que o processo criativo fluísse sem obstáculos ou imposições, procurando capturar a espontaneidade e a liberdade da ocasião.

A música de “Conjure” é, em geral, dominada pela tranquilidade e pelo recato, em conversas francas, quase sussurradas, entre violino e piano (ou vibrafone), aproximando-se das coordenadas de alguma música erudita contemporânea mais contemplativa. “Prophecy” dá início ao álbum e diz muito sobre o que se vai escutar daí em diante: as notas claras de Hwang sobre o piano esparso, em belos diálogos nos quais a melodia nunca é óbvia ou autocentrada. Mesmo nos momentos mais exploratórios, o violinista imbui as suas intervenções de forte carga emocional. “Silhouettes” começa com o vibrafone etéreo de Berger, a que se junta o violino, sublinhando os jogos de luz e obscuridade. Em “Beyond Reach” ressalta a tensão permanente, com o violino a deambular sobre o piano contido, substituído a dado momento pelo vibrafone, sem que a atmosfera da peça se altere sobremaneira.

Como é habitual na sua obra, Hwang carreia o lastro milenar da cultura chinesa, ainda que de forma subliminar. É o que parece suceder em “Vanishing Roots”, com o violino em pizzicato (a ecoar sons produzidos por instrumentos de corda orientais) a aliar-se ao piano. “Faith”, meditação partilhada, atesta a capacidade de Hwang para desenvolver linhas melódicas retorcidas e Berger, sempre a reagir a elas, adensa a atmosfera, avocando a parte final da peça. Nos seus contornos mais abstratos, “Below Zero” retoma o pizzicato, mas desta feita em interação com o vibrafone, funcionando como antecâmara para “Water Finds Water”, a peça mais extensa do disco, que me remete para o que acontece em muitos rios da Amazónia, cujas águas, ao se encontrarem, não se misturam, devido a diferentes temperaturas, densidades ou outros possíveis fatores (o fenómeno natural inspirou o grande Oscar Niemeyer para um dos seus derradeiros trabalhos, em 2005, um projeto de monumento que, volvidos estes anos, ainda não saiu da gaveta.)

Este outro encontro, entre Berger e Hwang, mostra dois músicos que interagem sem diluírem as respetivas identidades, celebrando a música livre e dando carta branca às mais profundas emoções humanas.

  • Conjure

    Conjure (True Sounds)

    Karl Berger / Jason Kao Hwang

    Karl Berger (piano, vibrafone); Jason Kao Hwang (violino, viola)

Agenda

01 Junho

André Santos e Alexandre Frazão

Café Dias - Lisboa

01 Junho

Beatriz Nunes, André Silva e André Rosinha

Brown’s Avenue Hotel - Lisboa

01 Junho

Ernesto Rodrigues, José Lencastre, Jonathan Aardestrup e João Sousa

Cossoul - Lisboa

01 Junho

Tracapangã

Miradouro de Baixo - Carpintarias de São Lázaro - Lisboa

01 Junho

Jam session

Sala 6 - Barreiro

01 Junho

Jam Session com Manuel Oliveira, Alexandre Frazão, Rodrigo Correia e Luís Cunha

Fábrica Braço de Prata - Lisboa

01 Junho

Mano a Mano

Távola Bar - Lisboa

02 Junho

Rafael Alves Quartet

Nisa’s Lounge - Algés

02 Junho

João Mortágua Axes

Teatro Municipal da Covilhã - Covilhã

02 Junho

Júlio Resende

Fábrica Braço de Prata - Lisboa

Ver mais