Fishes

Jacob Sacks: “Fishes” (Clean Feed)

Clean Feed

Gonçalo Falcão

Ao escrever o seu sermão aos peixes, o padre António Vieira quis “docere” (educar), “delectare” (agradar) e “movere” (persuadir). Jacob Sacks não nos elucida sobre quais foram as suas intenções ao escrever para este novo disco, “Fishes”, mas parece-nos que o caminho é o mesmo (sem o a vertente da fé). Isto porque a música tem um entendimento sobre a história do jazz, é lindíssima e motiva-nos a fazermos as pazes com um mundo que acabou de eleger um fascista para presidente do Brasil.

O pianista americano tem uma obra curta, apenas com seis discos editados desde 1999 e suficientemente espaçados no tempo para fazer com que cada um tenha uma solidez de ideias e de escrita que valha todos os cêntimos que o ouvinte neles investe. Os músicos portugueses conhecem bem a qualidade do nova-iorquino, que já tocou com João Lencastre, Sara Serpa, André Matos, Gonçalo Marques e Demian Cabaud.

Todos os temas parecem ter uma dimensão histórica, condensando uma leitura do percurso clássico do jazz e alinhando simultaneamente ideias que ainda não tinham sido ouvidas. As músicas abrem-se com naturalidade ao ouvinte, sem serem muito exigentes ou complexas. Vão depois revelando uma estrutura altamente instável, cheia de gavetas secretas e cantos escondidos de onde saem fórmulas musicais surpreendentes. Ficamos perante uma arquitectura musical sofisticada, à escala humana, assente em volumes simples, mas com conteúdos intrigantes. Oscilamos entre o micro e o macro, numa audição muito curiosa: o que pensávamos perceber afinal é muito mais intricado e interessante do que parecia.

O grupo que acompanha Sacks é também responsável por toda esta qualidade. O quinteto é composto por membros da “família” da editora da Parede: nos saxofones estão Ellery Eskelin e Tony Malabi, que traçam um jogo muito particular: Malabi mais melodioso e grave e Eskelin mais seco e com um fraseado estroboscópico fazem uma dupla que tem tanto de tradição jazzística como de abstracção. Constroem um contínuo de saxofone que soa como uma frase só, mas esquizofrénica, com duas vozes diferentes a falar uma com a outra. Por baixo, o piano entra na música como se fosse uma base mais brilhante, aguda e desconexa, atirando por vezes pequenas interjeições.

Michael Formanek toca seguro e discreto no contrabaixo, mantendo o andamento. Na bateria, Dan Weiss (actualmente membro do grupo de Rudresh Mahanthappa) é um elemento fundamental neste esquema montado por Sacks: com um uso muito particular da tarola e dos pratos, também em disparos curtos e rápidos, acompanha ritmicamente enquanto contribui para um certo desengonço que dá à música a sua originalidade. Há gente religiosa que procura o sustento da alma em livros sagrados. “Fishes” faz este serviço a profanos e crentes, com excelentes composições, cheias de irregularidades e tocadas com brilhantismo.

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    Fishes (Clean Feed)

    Jacob Sacks

    Jacob Sacks (piano); Ellery Eskelin (saxofone tenor); Tony Mallaby  (saxofones soprano e tenor); Michael Formanek (contrabaixo); Dan Weiss (bateria)

Agenda

10 Junho

Imersão / Improvisação

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

O Vazio e o Octaedro

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

Marta Hugon & Luís Figueiredo / Joana Amendoeira “Fado & Jazz”

Fama d'Alfama - Lisboa

10 Junho

Maria do Mar, Hernâni Faustino e João Morales “Três Vontades de Viver”

Feira do Livro de Lisboa - Lisboa

10 Junho

George Esteves e Kirill Bubyakin

Cascais Jazz Club - Cascais

10 Junho

Nuno Campos 4tet

Parque Central da Maia - Maia

10 Junho

Tim Kliphuis Quartet

Salão Brazil - Coimbra

10 Junho

Big Band do Município da Nazaré e Cristina Maria “Há Fado no Jazz”

Cine-teatro da Nazaré - Nazaré

10 Junho

Jorge Helder Quarteto

Fábrica Braço de Prata - Lisboa

11 Junho

Débora King “Forget about Mars” / Mayan

Jardins da Quinta Real de Caxias - Oeiras

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