Angles 3: “Parede” (Clean Feed)
Angles é o nome de um grupo do Norte da Europa que adopta diferentes configurações. Conhecemos bem o noneto e o sexteto; somos agora apresentados ao trio. É desde logo curiosa esta ideia de manter o mesmo nome para grupos diferentes, dando a entender que a música é a mesma, mas os músicos não. No centro do plano está o saxofonista sueco Martin Küchen e este, mesmo desenhando polígonos com diversos números de vértices, mantém-se congruente. A geometria musical é plana, feita com ideias simples, melodias curtas e baixos repetitivos. É esta a sua principal qualidade: crua no som, com os instrumentos gravados sem qualquer tipo de véu ou processamento e frases elementares que disparam improvisações fortes e intensas. Para que a banda mantenha a energia, Küchen chamou o contrabaixo de Ingebrigt Håker Flaten: o “viking” tem uma forma de tocar bárbara, com força, simplicidade e pureza, como reconhecemos de outras andanças (The Thing, The Young Mothers, Atomic, Starlite Motel). Nele topamos muito do espírito do rock, em termos de atitude e pulsação. Por vezes, as cordas do contrabaixo batem, num som típico do rockabilly, entrando num jogo duplo com a percussão. A bateria de Kjell Nordeson, que também vem da Suécia, é uma grande surpresa ouvida assim, quase nua. Rápida, cheia de meios técnicos, capaz de ser muito criativa na criação de sons interessantes a partir dos recursos normais do instrumento.
O trio faz uma música cheia de força, com um travo a rock (billy/punk) através de melodias intensas que ficam logo no ouvido. Em “Francisco” (terceiro tema), o “groove” do baixo é contagiante e o pé não pára de bater, porque a bateria nunca facilita a vida. Küchen está em grande forma, cheio de ideias e sopro. Para criar uma imagem mental do que podem esperar deste “Parede” (assim chamado porque foi gravado na vila da Parede, concelho de Cascais, mais exactamente no sótão da SMUP), diria que é uma espécie de “cold-hot bop” em que a soul é temperada pela típica vontade escandinava de resolver o assunto, sendo logo aquecido pela ânsia política de intervir, de mexer, de não ceder a um futuro imbecil.