Lina Nyberg: “Terrestrial” (Hoob)
“Terrestrial” é o último tomo do mais ambicioso empreendimento da cantora sueca Lina Nyberg, uma trilogia que teve início com “Sirenades”, associando uma “big band” ao seu quinteto, e continuou com “Aerials”, neste caso com o apoio de um quarteto de cordas. Agora, aproveita os préstimos de toda uma orquestra sinfónica, a NorrlandsOperan. A mera descrição podia levantar suspeitas de pretensiosismo ou megalomania se se tratasse do vulgar cançonetismo jazz, que tanta música atroz tem produzido por estes dias, mas não é assim: Nyberg é um caso à parte, e tanto no que respeita às características musicais que a definem (a sua adopção da forma-canção convencional, “mainstream” – inclusive com a já típica utilização de brasileirismos –, integra elementos experimentais, eruditos e da livre-improvisação, com a particularidade de o grupo que a acompanha incluir um dos guitarristas maiores da Europa nesta última área, David Stackenas) como na dimensão teatral dos seus projectos, derivada do facto de os seus temas contarem histórias.
Pois “Terrestrial” parece-se muito com aquilo a que se chamou “ópera jazz” desde o histórico “Escalator Over the Hill”, de Carla Bley e Paul Haynes, com a diferença de que é uma só a voz e de que as referências são mais de cabaré (Kurt Weill, Hanns Eisler?) do que propriamente operáticas (Verdi, Wagner). Curiosamente, pelo lado do jazz, há mais aqui de Gil Evans do que de Bley. O duplo álbum está dividido segundo as duas grandes temáticas de Nyberg, a natureza (CD1) e a humanidade (CD2). Com termos como estes: «I’m the planet I’m the Mother / I grow all things I own all things» (“The Planet”) e «O Humanity O Variety / Rely on the light and the water / Bringing us sons and daughters» (“O Humanity”). A obra tem tanto para oferecer, é tão rica nos seus múltiplos parâmetros, que necessitamos de várias escutas para a apreender por inteiro. No fim, ficamos com as medidas cheias. (Em Outubro, o ensemble de base de Lina Nyberg andará por Portugal.)