Miroslav Vitous: “Plays the Music of Weather Report” (ECM)
ECM
Miroslav Vitous (vénia) é um dos grandes. Tem discos gigantescos na década de 70 do século passado, começando por “Infinite Search” (1970). Nascido na antiga Checoslováquia, chegou a Nova Iorque em 1967 e a sua enorme qualidade musical integrou-o rapidamente na cena americana (Miles Davis, Stan Getz, Chick Corea, etc.). Foi um dos membros fundadores dos Weather Report, que Joe Zawinul queria como um supergrupo de jazz-rock voltado para a fama e o sucesso.
Vitous tinha outros objectivos. As diferenças levaram à sua saída em 1973, depois de tocar e compor nos cinco primeiros discos do grupo – “Weather Report” (1971), “I Sing the Body Electric” (1972), "Live in Tokyo" (1972), "Sweetnighter" (1973) e "Mysterious Traveller" (1974). Basta ouvi-los e comparar com os posteriores que tinham o baixo entregue a Jaco Pastorius – aqueles que efectivamente deram fama e sucesso ao grupo - para perceber claramente que havia diferenças enormes na forma de ver o futuro dos Weather Report. E no fundo é isso que, passados 40 anos, este disco nos traz: a visão do contrabaixista sobre o que poderia ser a banda. É por esta razão um registo histórico, imprescindível para perceber o percurso da formação.
O alinhamento do CD usa temas de vários momentos do grupo. Uns do período em que era co-responsável pela composição e estava no contrabaixo (“Seventh Arrow” e “Morning Lake”, do primeiro LP, “Weather Report”, que abre as portas a este modelo de fusão em 1971). Do quarto disco de estúdio, o excelente “Mysterious Traveller”, toca “Scarlet Woman” e uma variação, “Scarlet Reflections”; relembro que é neste disco que se dá a separação e que este tema é o único do novo baixista, Alphonso Johnson, que introduz o baixo eléctrico e o “groove” funky. Do período Pastorius o inevitável “Birdland”, que abria o LP “Heavy Weather”, e também “Pinocchio”, do LP “Mr. Gone”.
Assim, como vemos, este é um ajuste de contas com o passado. Mas não é um ajuste amargo ou afirmativo, é um ajuste musical, sem mágoas nem ressentimentos. A música é belíssima e tem um espírito pacificador, revendo a obra dos Weather Report e mostrando como esta poderia ter sido sob o seu comando ao lado de Zawinul. Não é um disco que procure ter “razão”, mas apenas mostrar um ponto de vista. E que belo é esse ponto de vista. A música fica muito mais aberta e abstracta. Os temas não têm a pressa do rock e dão lugar à improvisação. As melodias têm muito mais espaço à volta e percebemos melhor a sua beleza. Não são conclusivas, não se fecham para ficarem facilmente consumíveis. “Scarlet Woman”, por exemplo, é onírica, tem a materialidade de uma nuvem.
A escolha dos cinco músicos que acompanham Vitous tem paralelismos interessantes com os Weather Report, pois tanto Gerard Cleaver como Nasheet Waits têm a delicadeza e o uso dos pratos que Erskine tinha no início, antes de carregar o som. O turco Aydin Esen também usa os teclados de forma zawinulesca, explorando os sons estranhos e a presença da electrónica (então muito mais surpreendente do que agora, pois estávamos no início dos sintetizadores comerciais).
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Plays the Music of Weather Report (ECM)
Miroslav Vitous
Miroslav Vitous (contrabaixo, teclados); Gary Campbell , Roberto Bonisolo (saxofones soprano e tenor); Aydin Esen (teclados); Gerald Cleaver, Nasheet Waits (bateria)