Fernando Guiomar / Paulo Chagas: “Escape and Return” (Zpoluras)
Fernando Guiomar e Paulo Chagas podem não ser dos mais (re)conhecidos nomes com actividade nessa vasta área a que chamamos jazz, mas estão, sem dúvida, entre os melhores que nos seus respectivos instrumentos (a guitarra o primeiro, nas versões acústica e eléctrica, a flauta, o oboé, os clarinetes e os saxofones o segundo) encontramos em Portugal. E isso, talvez, porque são igualmente dos mais atípicos. Ambos com estudos clássicos, os seus trajectos têm sido transversais a géneros e estilos. Guiomar passou por vários projectos de avant-rock, entre os quais se destaca o grupo de formação variável Trape-Zape, mais recentemente um duo com o baixista Rui Sousa, o mesmo dos Zappanoia,. De há uns anos a esta parte tem-se dedicado também à improvisação, com a particularidade de não se sujeitar ao vocabulário estereotipado desta tendência. Chagas, pelo seu lado, tem andado entre o rock e a folk progressivos, o jazz criativo (ou nem tanto quanto isso, dado o seu gosto pelo património do be bop) e a música improvisada mais experimental, em bandas como Miosótis, Colectivo Orgástico, CCV Wind Trio, PREC e Zappanoia, ou compondo para dança, teatro e cinema.
Esta multíplice condição leva a que este primeiro disco enquanto dueto, “Escape and Return”, lançado pela editora de Paulo Chagas, tenha uma equivalente caracterização. Logo a abrir, com o tema-título, ficam a claro as referências prog de ambos, com o estabelecimento de ambiências e planos melódicos que poderiam ter sido congeminados pelos King Crimson ou os Genesis dos primeiros anos. Mais adiante, em “Nau dos Corvos”, já as premissas são outras, tomando um rumo exploratório bastante mais abstracto, com “Landscape with Mechanism” a introduzir depois um “groove” muito obviamente jazzístico. O curioso é que Guiomar e Chagas entraram em estúdio com o propósito de interpretarem peças do barroco e da música erudita contemporânea, mas acabaram por optar por algo que reflectisse tanto o seu comum interesse pela composição instantânea como o eclectismo das suas referências. Os resultados ilustram bem as imensas capacidades instrumentais destes dois músicos singulares e a inventividade que os caracteriza. Estamos em Fevereiro e já está aqui um dos álbuns do ano.