Introdução
O jazz em Portugal (Parte 1)
Esta é a primeira de uma série de crónicas assinadas pelo guitarrista e compositor Nuno Marinho sobre a forma como o jazz “acontece” no nosso país. Uma reflexão que se deseja que desperte outras…
Haverá 500 pessoas interessadas no jazz em Portugal? Apesar de serem vários os que procuram o jazz para desenvolver ou aprofundar os seus conhecimentos musicais, a maior parte dos amadores e interessados que por lá passam desencantam-se e seguem outro rumo.
A crescente afluência de jovens músicos às escolas de jazz tem, muitas vezes, por motivação o interesse em desenvolver competências gerais sobre música, improvisação e linguagem. Procuram recursos (técnicos e/ou estilísticos) que, simplesmente, lhes permitam alargar horizontes: tocar melhor e conhecer novos músicos.
Porém, esta tendência não se consubstancia num crescente mercado artístico, musical e jazzístico. O que é que se passa “no” e “com” o jazz em Portugal?
Historicamente, o jazz tem-se desenvolvido como uma estética algo elitista e preconceituosa. É certo que serão necessários certos conhecimentos técnicos que permitam ao amante de uma corrente artística apreciar devidamente o objecto da sua afeição. Assim tem sido no teatro, no bailado, na pintura ou na música clássica. Quem domina esse entendimento saberá, “a priori”, apreciar melhor a forma de arte escolhida.
Tal entendimento é razoável, pois assenta num paradigma racional e objectivo. Mas deixa de ser tão válido quando desemboca em sentimentos de superioridade “porque se sabe de jazz”. Na verdade, até é uma desvantagem, pois – a experiência assim o diz – quem se especializa numa só área do saber pode desenvolver falhas em todas as outras.
Convenhamos que, à partida, o jazz não é a forma musical mais simples e directa de se ouvir. Digamos que o jazz estará para a música popular/moderna como Kandinsky está para Rembrandt. Nenhum é melhor que o outro. Apenas exigem conceptualizações ou abstracções diferentes. Isso implica interpretações ao gosto de cada um, sem que tal deva implicar valor acrescido de uma em detrimento de outra.
Neste enquadramento, o jazz tem-se desenvolvido quase exclusivamente como música que vem de músicos e se dirige para outros músicos. O nível de abstracção e complexidade é elevado. A necessidade de construção mental, emocional e psicológica de um conjunto de conceitos prévios à audição do jazz leva o ouvinte a perder a experiência, por não a entender. Mas... será que tem mesmo de ser assim?
Qualquer forma de arte expressa-se e desenvolve-se ao reunir três elementos fundamentais: o artista, o espaço performativo e o público. Temas que aqui tratarei nos próximos dias…