Bernardo Moreira “Binau” (1932-2022)
Faleceu no dia 3 de novembro, aos 90 anos, Bernardo Moreira, figura fundamental para a história do jazz em Portugal.
“Binau”, assim era conhecido na família e no círculo de amigos mais próximos, nasceu em Coimbra, em junho de 1932. Engenheiro Civil de profissão e amador de jazz, uma paixão de toda a vida.
Em plena Segunda Guerra Mundial, o seu pai, professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (que chegou a acompanhar Artur Paredes, pai de Carlos Paredes), comprou um rádio para ouvir as notícias da guerra. Foi assim que o jazz entrou, para não mais sair, na vida do pequeno Bernardo. Mais tarde, começou a experimentar tocar com alguns amigos; faziam-no sobretudo em festas de estudantes, como amadores, no estilo de George Shearing, os seus temas, música para dançar, e eram constantemente desafiados para tocar. Aos 22 anos, rumou a Lisboa para estudar no Instituto Superior Técnico; já então era conhecido como “o tipo que tocava jazz”.
Bernardo Moreira esteve ligado ao Hot Clube de Portugal (a quem sempre agradeceu o facto de se ter tornado músico de jazz) desde praticamente os seus alvores; os estatutos foram redigidos em 1947 e enviados ao Governo Civil de Lisboa para aprovação, o que só viria a acontecer três anos mais tarde. Integrou o célebre Quarteto do Hot, formado em 1956/1957, mas apenas institucionalizado em 1963, para ir tocar ao Festival de Comblain-la-Tour, na Bélgica, ao lado do saxofonista Jean-Perre Gebler, do pianista Justiniano Canelhas e do baterista Manuel Jorge Veloso. Foi professor de História do Jazz e Presidente da Direção do clube durante mais de 20 anos.
Participou no disco “Just in Time” (2014), da cantora Paula Oliveira, mais uma vez ao lado de Manuel Jorge Veloso e do pianista e médico António José de Barros Veloso, na revisão de uma série de standards do jazz.
Um dos filhos, também Bernardo, também contrabaixista, disse em entrevista à jazz.pt: «O meu pai nunca teve um contrabaixo em casa, o que ainda hoje me deixa perplexo: como era possível tocar tão bem sem estudar.» É também pai do saxofonista e compositor Pedro Moreira, do trompetista João Moreira e do pianista Miguel Moreira (entretanto mais afastado da prática jazzística).
Em 2018, Binau recordou em entrevista ao jornal Expresso a inesquecível noite em que tocou com Gerry Mulligan e Louis Hayes, então de passagem pela capital portuguesa: «Nunca toquei tão bem na minha vida — aqueles dois monstros obrigaram-me a superar as minhas próprias barreiras.»
Parte uma figura histórica do jazz em Portugal. Mas as sementes que lançou estão a medrar por todo o lado: o jazz em Portugal vive hoje a sua fase mais vibrante. E em boa parte devemo-la a Binau.
A jazz.pt endereça à família e aos amigos de Bernardo Moreira as mais sentidas condolências.